domingo, 31 de janeiro de 2010

sobre os puros de espírito

certa vez me achava em uma daquelas situações que muitos podem achar incômodas: estava sentado em uma mesa de bar com uma guria com a qual havia tido relações íntimas - sim, vamos chamar de "relações íntimas" -, seu namorado e um amigo daqueles famosos por não conseguirem calar a boca e entregarem detalhes sórdidos melhor deixados em caixinhas esmagadas em algum lugar do poeirento sótão que chamamos de lembranças. alguns podem achar tais momentos incômodos, talvez até mesmo embaraçosos, mas eu os chamava de inferno carmático.
olá, meu nome é pavio e, sim, eu já me relacionei casualmente com mulheres. antes que me acusem de misógino, acho válido salientar que foram, no máximo de minhas possibilidades casanovianas, umas duas.
pois bem, estávamos lá e a cerveja, conhecida por não conhecer grandes afetos, não parava de chegar.
a noite seguia alta e meu amigo não parava de comentar a leves brados:
- ela é gostosa, hein? mas sou mais você do que esse pirralho do lado dela.
é, ele é daqueles que tentam agradar, mesmo quando essa é uma possibilidade tão distante quanto pegar um avião para katmandu e se alistar no primeiro mosteiro budista enfiado em alguma pedra milenar.
a conversa não saia daquela breve troca de idéias sobre entorpecentes ilegais, comuns a qualquer um de nossa idade - tenho 22 anos - que tenha tido algum passado válido a se comentar, ou sobre os diversos deslumbres conhecidos em nosso curto tempo neste campo astral.
e é isso. eles eram, na mais sincera das minhas intenções, perfeitos um para o outro. não importa quão novo fosse ele, eles se encaixavam, combinavam. seus encantos com momentos dos mais mundanos era algo que simplesmente não cabia em minha mente. e eu só conseguia pensar em dar o fora dali, ao mesmo tempo em que ficava lembrando de certos momentos bíblicos que não merecem ser contados aqui.
o tempo passava e a troca de olhares era inevitável - como haveria eu de negar um breve contato ocular quando as memórias inundavam cada palavra e pensamento que cruzava a minha mente? sim, sou um cara e ainda estou atrás de sexo, oras.
no entanto, eu me mantinha firme. tomava mais cerveja, jogava sinuca e procurava continuar minha vida naqueles instantes tão duradouros quanto o tempo que se leva para apagar um cigarro e procurar outro no maço.
pois bem, a saidera chegou e a despedida era inevitável e bem vinda. não podia ser de outra forma. não podia ser de melhor forma. pelo menos até o momento em que íamos ao supermercado sacar dinheiro para que outro conhecido pudesse pagar seu táxi para casa, quando meu amigo, tão querido pela noite que se aproximava de seu término, virou para mim e disse:
- isso aí, meu velho. tá certinho. como foi mesmo? comeu uma noite e ficou de boa depois, né?
- não. como eu ia te dizendo, eu era tão apaixonado que até terminei com minha namorada pra ficar com ela.
silêncio, como era de se esperar. finalmente ele havia atingido tamanho mal-estar que me garantiria paz suficiente para curtir minha fossa.
ledo engano:
- mas tu comeu, não comeu?
deus abençoe os puros de espírito.

6 comentários:

Anônimo disse...

puta texto empolado. chato pra caralho!!!

César Soto disse...

valeu!

Seu Oswaldo disse...

É isso aí, meu chapa, ninguém tá muito interessado na fossa do outro - como dizia Chico Buarque: 'a dor da gente não sai no jornal'...

O que o povo quer saber mesmo é se tu comeu ou não comeu, e, de preferência, com detalhes!

Camila Garcia disse...

Pra ser sincera? Achei o final perfeito.

Ana Lívia Destefani Luciano disse...

'deus abençoe os puros de espírito'
sempre, que já são abençoados, e cntinuem assim, e que, assim possam manisfestar-se aos outros

Faraó disse...

Bom texto, bicho! E, da próxima vez, ande com seu 38, ok?