terça-feira, 23 de setembro de 2008

sobre um final feliz

o amor que me perdoe, mas eu odeio políticas sexuais.

está bem, talvez não deva pedir perdão ao amor em si, mas ao sexo.
e, quem sabe, não deva nem pedir desculpas ao sexo, mas aos relacionamentos humanos.
já dizia o velho bardo: "há uma maré nos assuntos dos homens". realmente o há. e esta "maré", como assim a chamava william shakespeare, são as cretinas das políticas sexuais.

veja o caso de osmar, por exemplo. grande amigo era ele. infelizmente, osmar tinha um problema. seu problema tinha nome. tinha nome, R.G., olhos grandes e profundamente negros, pele clara com pequenas sardas salpicadas pelo nariz e na parte superior das bochechas, cabelos longos e esvoaçantes, daqueles de comercias de shampoo que se vê na televisão, se vestia muito bem, roupas vivas, descoladas e decotadas na medida certa, sorriso tímido mas apaixonante, uma pequena pinta ao lado esquerdo da boca com os dentes tão brancos e alinhados e 1,78 metro de altura.

era 1,78 metro de problema, seu nome era carolina e ela estudava administração na mesma turma que ele. pobre coitado, como haveria osmar de resistir? não teve nem chance! ele ainda ficara tão feliz ao descobrir que tinham algo em comum, um assunto com o qual puxar conversa. ela era - imaginem só, entenderão o problema - a melhor amiga de daniela, a garota com quem ele ficara logo na primeira festa do curso e que estava atrás dele desde então. tudo bem, osmar era um imbecil. estava completamente, perdidamente, desesperadamente apaixonado pela melhor amiga de sua grande admiradora e não via nenhum empecilho nisso.

osmar, meu querido, esquece essa guria. só vai lhe dar dor de cabeça. não convém correr atrás de melhor amiga. você conhece as mulheres melhor que isso. era o que eu dizia. mas ele respondia, confiante, que não. a conquistaria de qualquer forma. estava idioticamente cego. enfim, ele não conhecia as mulheres melhor que isso.

antes que alguma amiga enfurecida venha me acusar de sexismo, permitam-me a defesa. dizia "as mulheres" simplesmente pelo fato de osmar, meu amigo, ser um heterossexual muito bem resolvido. meu problema mesmo sempre foi com as políticas sexuais, sejam elas entre mulheres ou entre homens. agora, se ele não podia ver nem ao menos a encrenca em que se metera, imaginem como reagiria se eu dissesse: "osmar, meu velho. deixe disso. essas políticas sexuais são de foder. e olha que nem é no bom sentido". dá pra ouvir as velhas engrenagens tentando funcionar em meio a tanta ferrugem e teias de aranha?

e lá foi osmar, partir para a ofensiva. na primeira festa, pagou bebidas a carol. na segunda, ofereceu-lhe carona. na terceira, pateticamente, tentou beijá-la.
epa, osmar! que isso?
poxa, é que a gente estava se dando tão bem...
mas, osmar, - imagine aqui uma cara de piedade - você sabe o quanto a dani gosta de ti. e assim carol saiu pulando pela pista de dança, não sem antes dar aquele último olhar de piedade para trás. aquele que fica gravado na mente até o momento em que se fecha os olhos antes de dormir, isso caso consiga-se dormir. caso contrário, fica gravado até o dia seguinte, e acompanha cada momento maravilhoso proporcionado pela ressaca, física e moral.

você, reles mortal, há de imaginar que osmar desistiria, certo? pois devo confessar-lhe que esta possibilidade chegou a cruzar o pensamento de meu intrépido amigo.

ao contrário, osmar e eu bolamos uma complexa estratégia para dobrarmos carol. antes de mais nada, tínhamos de descobrir se ela realmente não ficava com ele por causa de daniela ou se apenas a usava como desculpa para evitar o confronto que viria com o "cara, não quero ficar contigo, mas a cerveja e as caronas podem continuar, viu?". parecíamos duas colegiais, eu sei, cheios de estratégias e planos mirabolantes - entrega aquele bilhetinho pro luquinhas? mas não fala que fui que mandei, hein? hihihi.

políticas sexuais. se não se pode com elas, junte-se e faça proveito.

então eu comecei a ficar amigo de carol, tentar arrancar qualquer pista que fosse sobre suas verdadeiras intenções com osmar. o pobre coitado ficava morto de ansiedade pelos relatórios diários. e aí? ela deixou escapar alguma coisa? não cara, mas acho que estou chegando lá. já passamos os dois primeiros namorados, a perda da virgindade e temos discutido a vez em que ela quase fugiu de casa com o sócio do pai. acredita que o coroa nem ao menos sonha com isso? tá, tá. não quero saber dos namorados antigos. só me avisa quando ela falar alguma coisa de mim.

o tempo passou e ela deixou, finalmente, escapar que até gostava dele. achava-o um cara divertido e, afinal, devia haver algum motivo muito forte para a dani gostar tanto dele, não?
essa era a deixa para passarmos para a fase dois. sim, caro leitor, nosso plano tinha fases. entretanto, esta parte era mais complicada. eu teria de ir para o sacrifício. ora, o que não fazemos pelos amigos, não? minha missão era a de virar um agente-duplo ativo, tentando corromper nosso maior inimigo. neste caso, o inimigo conhecido pela alcunha de daniela, ou, simplesmente, "dani".

ela tinha seu charme, apesar de ser doida de pedra. eu podia me esforçar para fazê-la esquecer o osmar, nem que isso custasse alguns beijinhos. ele era meu amigo, oras. era meu dever cívico pegá-la.

assim, enquanto osmar iniciava uma reaproximação lenta e gradual com carol, eu partia para cima de sua admiradora com tudo o que eu tinha. carreguei livros, passei a usar apenas roupas limpas, perfume importado, sorriso encantador, olhares 43, 44 e até o 45, aquela fatal ajeitada da franja caída por sobre os olhos para trás da orelha dela, com a mão descendo suavemente pela nuca até a parte frontal do pescoço. posso não ter grandes encantos, mas a vida me ensinou algumas manhas.

ela se fez de difícil, a princípio. tinha de fazê-lo e eu não esperava mesmo que fosse coisa fácil. no entanto, a persistência é a mãe de todos os cafajestes e veio a me abençoar. cinco semanas depois, em uma festa em que a banda que se apresentava era a menos afetada pelo álcool do recinto, arranquei-lhe um beijo. de daniela, não da banda, embora quem estava lá naquela noite possa jurar que tudo era possível. ela relutou brevemente, se entregou ao beijo, depois recobrou a consciência, me empurrou e saiu em direção ao banheiro. poderia parecer uma tentativa falha, mas a duração do beijo foi longa o suficiente para atingir seu objetivo. carol estava nos arredores e testemunhou parte da cena.

pronto, agora a guria já vai estar mais receptiva. deve estar confusa e achando que a outra te esqueceu. vê se não faz merda. com esse conselho em mente, osmar partiu mais uma vez determinado. estava determinado, mas não confiante. aquela primeira cagada de tentar beijá-la do nada e a rejeição o haviam abalado profunda e definitivamente. dessa forma, a reaproximação continuava lenta e gradual e, pior, não passava de uma reaproximação.

com isso, continuei em meu papel de agente infiltrado na mente de carol, conversando todos os dias com ela, fazendo propaganda, você sabe, o procedimento padrão. mas o tempo passava e osmar não tomava a iniciativa, não partia para o momento decisivo. pobre infeliz. diversos avisos foram dados. desse jeito, vai perder a guria, moleque. ninguém gosta de tanta parcimônia relacionamental.

fui amaldiçoado com essa minha visão objetiva sobre eventos externos aos meus interesses, mesmo que, àquela altura do campeonato, eu já seguisse meus próprios objetivos. não deu outra, alguém se adiantou e carol não estava mais desimpedida, nem mesmo interessada.

ah, essas políticas sexuais, você tem de adorá-las.

hoje, um ano após tudo aquilo, não tenho mais a mesma relação que tinha com meu querido amigo osmar. não temos relação alguma, aliás. ele, infelizmente, não consegue superar o fato de que estou namorando a guria de seus sonhos. sinto falta dele. tudo bem, talvez nem tanto.

somos muito felizes, carol e eu. claro que dou das minhas escapadelas, mas o que se pode esperar de um relacionamento que já começou em inverdades?




nota do autor:
tema sugerido por bruno volpato, do blog música pra ler e meu colega no curso de jornalismo.
este texto não é auto-biográfico. ao menos a maior parte dele.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

sobre a procura


Chasing Amy, por Kevin Smith, 1997


Silent Bob: Chasing Amy.
(Shocked silence, more for the audience than anyone else)

Holden: What? What did you say?

Bob: You’re chasing Amy.

Jay: Why do you so shocked for, man? Fat bastard does this all the time. Think just because never says anything, it’ll have some huge impact when he does open his fucking mouth…

Bob: Jesus Christ, why don’t you just shut the fuck up. You’re yap, yap, yapping all the time. Give me a fucking headache. (to Holden) I went through something like what you’re talking about, a couple years ago, this chick named Amy.

Jay: When?

Bob: A couple years ago?

Jay: What, you live in Canada or something? Why don’t I know about this?

Bob: Bitch, what you don’t know about me I could just about squeeze in the Grand fucking Canyon. Did you know I always wanted to be a dancer in Vegas? (does a gesture with his hands, a reference to a move by the exotic dancers in “Showgirls”) Betcha ya didn’t even know that shit, did ya?

Jay: So tell your fucking story so we can get outta here and smoke this.

Bob: So, there’s me and Amy. And we’re all inseparable, right? Big time in love. Then four months down the road, the idiot gear kicks in, and I ask about the ex-boyfriend. Which, as we all know, is a really dumb move. But you know how you don’t wanna know, but just have to know–stupid guy bullshit. So, anyway, she starts telling me about him. How they fell in love, how they went out for a couple of yeas, how they lived together, her mother likes me better, blah blah blah blah blah. And I’m okay. Then she drops the bomb. And the bomb is this: it seems that a couple of times while they were going out, he brought some people to bed with him, “menage a troi,” I believe it’s called. And this just blows my mind, right? I mean, I am not used to this sorta thing; I was raised Catholic, for Gods sake.

Jay: Saint shithead.

Bob (to Jay): Do something. (to Holden) So I’m totally weirded out by this, right? So I start blasting her. I mean, I don’t know how to deal with what I’m feeling, so I figure the best way is to call her ’slut,’ tell her she was used. I’m out for blood, I really want to hurt this girl. I’m like, “What the fuck is your problem,” right? And she’s just trying to calmly tell me it was that time, it was that place, and she doesn’t feel like she should apologize because she doesn’t feel that she’s done anything wrong. And I say, “Oh, really?” That’s when I look her straight in the eye, tell her it’s over. I walk.

Jay: Fucking-A.

Bob: No, idiot, it was a mistake. I wasn’t disgusted with her, I was afraid. In that moment, I felt small, like I lacked experience, like I’d never be enough for her or something like that, you know what I’m saying? But what I did not get: she didn’t care. She wasn’t looking for that guy any more. She was looking for me, for the Bob. But by the time I figured this all out, it was too late. She had moved on. And all I had to show for it was some foolish pride which gave way to regret. She was the girl. I know that now. But (lights a cigarette) I pushed her away. (pause) So I spend every day since then chasing Amy. (pause) So to speak.